terça-feira, 27 de março de 2012

domingo, 13 de fevereiro de 2011

O quê a política entende de Natureza?

Num país onde existe megadiversidade biológica como no Brasil, o zelo por seus recursos naturais deveria ser bem maior, ainda mais considerando o avanço do conhecimento científico sobre o tema que vem ocorrendo nas últimas décadas, que pode e deve fornecer subsídios para a tomada de decisão mais adequada. Esse processo deve ser desenvolvido sem que forças políticas e econômicas interfiram, pois inexoravalmente elas tem o poder de mascarar as medidas realmente eficazes e eficientes, já que estão sujeitas aos interesses daqueles poucos que tem muito. Vejam adiante como essa negligencia pode ceifar muitas vidas, o que deveria ser inaceitável politicamente.
O Código Florestal Brasileiro (CFB), datado de 1967, vem sendo questionado pela bancada ruralista do Congresso Nacional Brasileiro. Em nível nacional, estão questionando a validade do mesmo diante de uma demanda cada vez maior por alimentos e desenvolvimento social. Vale lembrar que desenvolvimento social nunca foi prioridade governos brasileiros, conforme mostram os investimentos anuais em educação e saúde, que deveriam ser crescentes, mas estão sempre entre as últimas da lista política, pois em essência, não garantem votos para as eleições. Invariavelmente, educação e saúde são as maiores bandeiras em épocas de campanha eleitoral, mas são esquecidas com a mesma intensidade nos anos que se seguem.
Voltando ao Código Florestal, a idéia básica é aumentar a área produtiva (diminuindo as áreas de reservas florestais) para, consequentemente, aumentar produção, principalmente dos pequenos proprietários, e assim alavancar a economia brasileira, dizem eles. Além de emitir, sem qualquer tipo de ressentimento, o atestado de óbito de milhares de pessoal anualmente, o governo ainda perdoará o passivo ambiental dos ‘sem-reserva’, sejam eles pequenos ou grandes proprietários.
A perda de vidas por negligência politica é fato demonstrado e erro recorrente. Se o Código Florestal Brasileiro fosse cumprido, ou ao menos tentado a sê-lo, os estragos teriam sido bem menores. Isso é outro fato, que pode ser cientificamente comprovado, e não é difícil de fazê-lo. Qualquer técnico com um pouco de informação sobre geografia e ordenamento territorial poderia sobrepor os limites de Áreas de Preservação Permanentes (APP’s), preceituadas pelo CFB, às áreas afetadas pelas chuvas e analisar quantas das áreas afetadas estão dentro das APP’s. Além de não entender nada de processos naturais, aos quais estamos condicionados desde o início e estaremos até o fim (a não ser que efetivamente colonizemos outro planeta), a política brasileira ainda desdenha de seu povo, do conhecimento que seus cidadãos produzem, e o mais grave, permite que milhares de pessoas morram, sem prestar qualquer tipo precaução. Os desatres naturais que aconteceram ao mesmo tempo na Austrália foram maiores que os da região serrana do Rio de Janeiro em 2011. Por que lá o número de mortos foi muito menor?

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A Supremacia da Serra do Mar

Quem ousa a habitar minhas matas ciliares e minhas encostas? Sabem como fazê-lo? Na quantidade certa, na hora certa, de forma que considerem minhas oscilações, extremos e condições, mostrando o devido respeito pelo qual devo ser tratada? Respeito que não cessa nunca, pois sou maior que vós, na medida que controlo a água, minhas encostas, meus declives, condições climáticas, enfim, tudo que vos alimenta e lhes traz conforto e qualidade de vida? Praticamente, todos os anos dou o mesmo recado, mas parece que a única espécie tida como autoconsciente é a única a ignorar os valores intrínsecos de quem a governa. Além do Deus espiritual, onipresente e benevolente que tanto devotam, sou a força real e vívida que lhes castiga agora e todos os anos, para mostrar que sois governado por forças concretas que rotineiramente vos insistem em ignorar. Resgatem a ecofilia dentro de vós e voltarão a saber como moderar minhas forças.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O REAL VALORIZADO E O MESMO BRASIL DE SEMPRE

O governo brasileiro já comprou mais de 38 bilhões de dólares este ano na tentativa de conter a entra da desta moeda no país, evitando assim a supervalorização do Real. A conta é simples, com o Real forte e o dólar mais barato, as nossas exportações diminuem porque nossos produtos estão mais caros, ao mesmo tempo que importar produtos estrangeiros fica bem mais atraente aos bolsos brasileiros. O resultado é que a balança comercial brasileira acaba prejudicada, ou seja, a dívida aumenta, já que estamos comprando mais do que vendendo. Num país que mantém a mesma política financeira desde a implantação do plano Real, ou seja, altíssimas taxas de juros e uma das mais pesadas cargas tributárias do mundo, a conta que já estava no vermelho cai para o nível "roxo". Me impressiona o fato de mais de 55 milhões de brasileiros acharem que o país está melhor do que nunca. Se bem que, até entre os letrados, a memória brasileira nunca foi nosso forte, não é mesmo? O fato é que o Brasil poderia estar muito além do que é e está hoje, se tivesse tido a coragem de fazer as reformas financeiras necessárias para alavancar sua economia. Ficar na retaguarda, agachado e esperando a maré de azar (a crise financeira de 2009), numa postura claramente conservadora, e muito longe de ser pró-ativa, já sabemos como fazer. Coragem, audácia e inteligência para ir além e romper as barreiras do fisiologismo conservador que durante décadas nossa esquerda pregou, não a vimos fazer! O brasileiro diz que sua vida mudou, mas continua pagando altas taxas de juros (ou alguém aí nunca entrou no vermelho pra ver o desespero que dá?) e os tributos mais caros do mundo! Ainda estou pra ver alguma análise nacional consistente, que seja imparcial e que venha de alguém que não leve em consideração sua classe social. Tem baboseira de todos os lados, todos parciais, umbilicais! Quer saber, vou comer alguma coisa e tomar uma cerveja que tudo isso passa.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

RECLAMO SIM!

Reclamo mesmo! Por achar que há mais injustiças do que o tolerável! Por ver tanta coisa errada e ver tão pouca gente tendo atitudes para mudar! Por achar que o mundo pode e deve ser melhor! Reclamo por não ter tudo que anseio, e por todos àqueles que se determinam a ir atrás dos seus sonhos, que seguem suas vontades, e para que todos tenham seus verdadeiros valores respeitados! Reclamo por achar que as pessoas deviam se doar mais a causas maiores e mais nobres e fico furioso com àquelas que perdem tempo com coisas pequenas! Sou indiferente àqueles que duvidam que o amor sempre prevalece! E reclamo por querer ser maior sempre para mim e pelos demais, para fazer a diferença na vida deles! Quem não reclama ou é porque é muito acomodado, tem tudo e acha que isso tudo está certo, ou já é pobre de espírito demais pra fazer alguma coisa, não tem mais nada, sequer um resto de esperança!

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Retrocesso ambiental brasileiro diante às tendências mundiais

Na contramão da tendência mundial de colocar as questões ambientais como prioridade na pauta governamental dos países, o Código Florestal Brasileiro está em iminente processo de revisão. Quem lidera o processo é o nosso ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Reinhold Stephanes, que esteve recentemente em Campo Grande para comentar este assunto e outros no tocante ao agronegócio no Mato Grosso do Sul (Informe Agropecuário MS, Nº274 de abril de 2009).

Stephanes argumenta que a revisão do Código Florestal é imprescindível para o desenvolvimento do país como uma potência agropecuária no cenário mundial, até mesmo no setor de biocombustíveis. Os argumentos que ele apresenta para tais modificações encontram respaldo em recente estudo publicado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), unidade Monitoramento por Satélite, localizada em Campinas, SP. Neste estudo, liderado por Evaristo de Miranda, a lei ambiental brasileira é colocada como principal entrave para a ampliação de áreas agricultáveis, com potencial promissor para alavancar a balança comercial brasileira e firmar o Brasil como líder mundial do setor. Segundo este estudo, se o código fosse cumprido à risca (isso nunca aconteceu desde sua publicação em 1965), apenas 30% do país estaria disponível para a expansão do agronegócio brasileiro.

Os resultados deste estudo estão sendo duramente criticados pelos próprios técnicos daquela unidade da Embrapa, que argumentam a falta de critérios claros e de metodologia precisa para as conclusões tiradas. Ao que nos parece, os resultados e conclusões se alinham aos anseios da bancada ruralista e empresarial, que demanda de expansões em seus setores para justamente, saírem ilesos da atual crise econômica mundial.

De fato, o cumprimento à risca do nosso código florestal, considerando também as diversas áreas protegidas do país, o nosso montante protegido é bem satisfatório ao que se destina. Porém, nossa área destinada à agricultura também é muito grande, e pode aumentar sua produtividade com uso de tecnologias agrícolas modernas, que suprirão a crescente demanda por alimentos durante dezenas de anos. O próprio presidente Lula sabe disso e já falou publicamente estas mesmas palavras. O vice-presidente do Conselho Nacional de Pecuária de Corte (CNPC), Sebastião Guedes disse que não é preciso derrubar mais uma árvore sequer para termos uma pecuária moderna e produtiva durante o 22º Encontro de Tecnologias para a Pecuária de Corte, que aconteceu no final de abril, em Campo Grande. Do outro lado dessas mentes sóbrias e com visão de futuro e, como se não bastasse o empenho do ministro Stephanes em depreciar nosso código florestal, o Supremo Tribunal Federal acaba de derrubar de piso para teto, os 0,5% do valor do empreendimento, em caso cabíveis de multa ambiental. Como se as leis ambientais fossem cumpridas e os infratores devidamente penalizados. Um dos exemplos mais evidentes com relação ao descaso com as questões ambientais e à irresponsabilidade social foi dado pelo governo de Santa Catarina. Como se não bastassem os desabamentos que ocorreram neste estado no início do ano, como decorrência do mau uso do solo e plantio em Áreas de Preservação Permanente (APPs) (justamente as áreas que estão na mira do ministro da agricultura), o governo deste estado decretou a diminuição das APPs de 30m de faixa para apenas 5m no caso de propriedades localizadas em regiões de nascentes e de pequenos córregos. Além de ser conivente com as mortes decorrentes dos desabamentos no início deste ano, o governo catarinense dá enormes passos para trás com relação ao seu meio ambiente e à sua sociedade, além de confrontar, em ato claramente inconstitucional, a avançada legislação ambiental brasileira.

Para concluir, tomamos emprestadas as palavras da ex-ministra do meio ambiente Marina Silva “no momento em que o mundo reconhece, em meio ao final de festa de um modelo consumista, poluidor e concentrador de riquezas, que a saída envolverá forte guinada para uma relação mais equilibrada com o meio ambiente. E, justo quando poderíamos assumir liderança inconteste nesse rumo, mergulhamos no atraso“ (Folha de S.Paulo, 20/04/2009). Até quando deixaremos a ganância, o poder e o lucro a qualquer custo derrubarem nossa racionalidade, sensibilidade e humanidade, que são os únicos caminhos que podem nos levar a um futuro mais justo, seguro e sustentável?

terça-feira, 12 de maio de 2009

Passeio por uma Terra Encantada pelas Águas



Após o desgaste gratificante do planejamento estratégico organizacional da Associação de Proprietários de Reservas privadas do Mato Grosso do Sul (REPAMS), os Srs. Eduardo Coelho, Rodrigo Castro e Laércio Machado e eu rumamos para as três principais atrações turísticas de Mato Grosso do Sul: à flutuação no rio da Prata (RPPN Cabeceira do Prata), à futura e magnífica experiência turística subaquática “Lagoa Misteriosa” e ao Buraco das Araras. Todas elas são formidáveis e cada uma promove ao seu visitante uma sensação diferente, um sentimento único. Na Cabeceira do Prata, os turistas são convidados à quase tocarem peixes como o dourado, a piraputanga e os pacus; munidos de máscaras e snorkel os visitantes percorrem um trecho de mais de 2.000 m do rio, com duração aproximada de 1,5h de flutuação passiva (porém com certa adrenalina em alguns trechos), por onde se pode apreciar a rica natureza subaquática e lembrar daquela forte ligação com a água, que todos os seres vivos tem. Na Lagoa Misteriosa flutuamos nas suas águas azuis e sobre um abismo visível enorme logo abaixo (ai se alguém tirar a tampa lá de baixo! rss). Isso nos fez sentir o quão pequenos somos diante a magnitude da natureza. Por outro lado, a grandiosidade de vivenciar aquilo e sentir-se parte de uma coisa maior, nos torna humanos e nos aproxima dos céus! O espetáculo das araras vermelhas, canindés e outras centenas de aves fica por conta do Buraco das Araras. Lá é possível perceber que ainda restam lugares seguros para a nossa exuberante fauna silvestre. Essas belíssimas reservas, pertencentes à proprietários rurais, demonstram que é possível desenvolver a captação de recursos e a conservação de espécies e habitats, ao mesmo tempo em que se promove o prazer e o bem-estar humanos. (George Camargo, 09/05/2209).

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

O que Einstein disse sobre a crise?

"Não podemos pretender que as coisas mudem se sempre fazemos o mesmo. A crise é a melhor bênção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias. Quem supera a crise, supera a si mesmo sem ficar "superado".

Quem atribui à crise seus fracassos e penúrias, violenta seu próprio talento e respeita mais os problemas do que as soluções.

A verdadeira crise é a crise da incompetência.

O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar as saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios, sem desafios, a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. É na crise que se aflora o melhor de cada um. Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo.

Em vez disso, trabalhemos duro.

Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la."

Portanto, faça diferente do que você vem fazendo até agora!

sábado, 6 de dezembro de 2008

A tal da sustentabilidade

Fernando Fernandez

14/11/2008

Nem sempre assim é, mesmo se lhe parece.
Parafraseando William Shakespeare, em "As you like it"



Não, não adianta: você não pode escapar de ler ou ouvir a palavra "sustentabilidade", ainda hoje, em algum lugar.

Poucas palavras, hoje em dia, estão tão na moda quanto sustentabilidade. Ela é repetida à exaustão - seja nos jornais, na TV ou na internet; seja nos discursos dos políticos ou nos anúncios das mais variadas empresas. Pode-se dizer que "sustentabilidade" é quase um mantra dos nossos tempos pós-modernos.

Podemos traçar a origem da popularidade da palavra "sustentabilidade" ao conceito de "desenvolvimento sustentável", definido formalmente pela primeira vez no Relatório Brundtland em 1987 como "desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras atenderem às suas próprias". Esse conceito tornou-se imensamente popular nas últimas décadas, como a panacéia que permitiria conciliar o desenvolvimento com a necessidade cada vez mais óbvia de não destruir a própria base de recursos da qual o desenvolvimento dependia. A palavra sustentabilidade, embutida no conceito, tomou então conta da mídia. Toda hora fala-se que esse ou aquele recurso natural está sendo explorado de forma sustentável.

À primeira vista podemos pensar que isso é ótimo. Devemos então estar cercados de práticas de exploração sustentável de recursos naturais, permitindo manter os tais recursos para as gerações futuras. Ah, sim, claro, conservando a natureza também.

Será?

Nos últimos anos, vários pesquisadores têm estudado a questão de se algumas explorações de recursos naturais apresentadas como sustentáveis de fato o são. Um deles foi o paraense Carlos Peres, que com vários colaboradores estudou se era ou não sustentável a exploração da castanha-do-Pará. Na natureza, esses frutos da castanheira (Bertholletia excelsa) são abertos por cutias. As cutias muitas vezes enterram as sementes para consumi-las depois, mas são uns roedores desmemoriados que muitas vezes esquecem onde enterraram as sementes, que então germinam. Hoje o florescente mercado internacional para as chamadas "Brazil nuts" tem deixado pouca coisa para as cutias. A exploração da castanha-do-Pará por populações locais na Amazônia tem sido frequentemente apontada como um exemplo de exploração sustentável – uma das "jóias da coroa" do governo Lula no que se refere ao "uso sustentável" de recursos naturais.

O estudo de Peres e seus colegas foi publicado na Science, a mais prestigiosa revista científica do Mundo (Science, 302: 2112-2114, 2003). Foi um estudo muito amplo. Em nada menos que vinte e duas localidades espalhadas pela Amazônia - a maioria delas no Brasil, mais algumas no Peru e na Bolívia - os autores mediram todas as castanheiras maiores que 10 cm DAP (Diâmetro à Altura do Peito). As árvores jovens, ou seja, as que ainda não produzem frutos, são aquelas com DAP menor que 60 cm. É, castanheiras são árvores bem grandes. O estudo comparou a freqüência de árvores jovens em localidades com diferentes antiguidades e intensidades de exploração.

Os resultados foram claros e perturbadores. A proporção de árvores jovens variava de 31 a 76% nas cinco localidades onde não havia exploração de castanhas-do-Pará. Caía para 10,6 a 47% nas dez localidades pouco exploradas, e para 3,8 a 25% nas cinco localidades moderadamente exploradas. Já nas três localidades persistentemente exploradas, a proporção de castanheiras jovens caía para ínfimos 0,7 a 1,6% - dezenas de vezes mais baixa que a proporção normal. Pior, em uma dessas três localidades as poucas castanheiras jovens eram rebrotamentos de árvores quebradas por ventos, as quais não se reproduzem mais. Ou seja, as populações exploradas tendem a ser populações velhas, com poucas árvores jovens.

A conclusão de Peres e seus colaboradores resume tudo com perfeição: "a mensagem clara é que as práticas de coleta de castanha-do-Pará não são sustentáveis a longo prazo". Por algumas décadas, a produção pode até ser mantida porque as castanheiras vivem e frutificam por muito tempo. Mas depois que as árvores adultas de hoje morrerem nas áreas exploradas, não há quase árvores jovens vindo depois para substituí-las. Ou seja, a segunda e tranquilizadora parte da definição de sustentabilidade, "sem comprometer a habilidade das gerações futuras atenderem às suas próprias [necessidades]" acabava de ir para o espaço.

Num estudo mais recente, também na Amazônia, Plinio Sist e Fabrício Nascimento, dois pesquisadores da EMBRAPA, analisaram a sustentabilidade da chamada "exploração madeireira de baixo impacto" ("reduced impact logging" ou RIL) (Forest Ecology and Management, 243: 199-209, 2007). RIL é uma técnica pela qual apenas as árvores acima de um certo diâmetro, das espécies comerciais, são retiradas, deixando as demais árvores no lugar. A área estudada, na Fazenda Rio Capim, em Paragominas (Pará), era explorada pelo grupo CIKEL – Brasil Verde. Um detalhe muitíssimo importante, a "sustentabilidade" da exploração na Fazenda Rio Capim é certificada pelo FSC ("Forest Stewardship Council"), a mais tradicional e exigente entidade internacional que fornece selos verdes para companhias de exploração madeireira no Mundo.

Sist e Nascimento fizeram um planejamento experimental cuidadoso, e coletaram uma imensa quantidade de dados. Antes do corte das árvores, utilizaram duas linhas de amostragem, cada uma incluindo nove áreas amostrais de 100 x 100 metros cada. Em cada área, identificaram e mediram nada menos que todas as árvores com DAP igual ou maior que 20 cm – um trabalho hercúleo. Depois da extração das árvores comerciais, verificaram quantas das restantes árvores da floresta haviam sido mortas ou danificadas por esse processo. Além disso, usando dados sobre o crescimento das árvores, calcularam quanto tempo as árvores comerciais levariam para repor o estoque que havia sido retirado. Um ciclo de 30 anos – ou seja, 30 anos entre extrações sucessivas de madeira da mesma área – é o recomendado por lei na Amazônia brasileira.

Novamente os resultados foram perturbadores. Sist e Nascimento estimaram que apenas metade do estoque das madeiras comerciais poderia ser reposto após o ciclo "legal" de 30 anos. Ou seja, novamente a exploração dita sustentável na verdade não é sustentável, pela própria definição. Pior que isso, é preciso olhar também a questão da conservação ou não da floresta como um todo. Os dois pesquisadores encontraram que em média nada menos que 13,9% das árvores restantes de cada área haviam sido mortas, mais 6,7% danificadas com diferentes graus de severidade, durante a extração das árvores comerciais. A abertura do dossel – ou seja, as "falhas" na continuidade do topo da floresta – tinha duplicado a triplicado. Em resumo, trata-se de uma exploração de recursos que não permite manter os níveis desses recursos para as gerações futuras, e além disso causa um dano considerável à floresta. Olhe bem que a CIKEL tem sido considerada um dos melhores exemplos de bom manejo florestal - imagine as outras companhias. Sist e Nascimento foram ainda mais além e apontaram que a não-sustentabilidade que eles verificaram não era em absoluto um resultado isolado, mas sim similar ao de outros estudos desenvolvidos no sudeste da Ásia.

Os estudos que discuti são apenas dois, e pode-se perguntar se são apenas exceções a uma suposta regra geral de explorações de fato sustentáveis. Pode até ser, mas não tenho muita esperança disso. De qualquer forma, eles mostram, no mínimo, que alguns dos casos apontados como sendo de exploração sustentável na verdade não o são.

Desculpe, meu caro leitor, se bombardeei você com tantos resultados de demografia. Você tem razão, demografia – o estudo das populações – pode ser um pouco árido às vezes. Tentei colocar tão poucos tediosos números quanto consegui. Mas acredite, os que coloquei foram por uma boa causa. Foram para mostrar que aquilo que um tecnocrata chama de "recurso natural" eu chamo de "população biológica". Qualquer uso de uma população de animais ou de plantas só pode ser sustentável se as entradas de indivíduos para a população (i.e., nascimentos e imigração) continuarem compensando, em longo prazo, as saídas (i.e. mortes e emigração). Como saber isso? Estudando a população em questão. Simples assim. Se uma dada exploração é sustentável ou não, isso é uma questão técnico-científica, fundamentalmente demográfica, que precisa ser respondida com a aplicação de boa ciência. Tudo isso deveria ser o óbvio ululante, como diria Nelson Rodrigues. Mas no nosso Mundo de hoje, onde esse assunto tem sido tão abusado pela ideologia e pela propaganda, às vezes é necessário dizer o óbvio.

Você pode ter notado que tanto o estudo de Peres e colaboradores como o de Sist e Nascimento foram a posteriori, ou seja, visaram analisar a sustentabilidade ou não de uma exploração que já existia e que, em ambos os casos, era dita sustentável. É claro que seria desejável ter estudos a priori, ou seja, testar se a exploração de um dado recurso natural é de fato sustentável antes de autorizá-la. Onde estão os estudos a priori? Pode até haver alguns, mas são raríssimos. Noventa e seis por cento das reservas extrativistas brasileiras não têm sequer plano de manejo, quanto mais avaliação de sustentabilidade. Ora, então, a pergunta que não quer calar é: se quase não há estudos a priori, por que a gente ouve falar que tantas atividades são sustentáveis?

Por uma razão muito simples: porque na grande maioria das vezes a palavra sustentabilidade não tem sido usada em seu sentido real. Quando um empresário diz que sua empresa é sustentável, na maioria das vezes o que ele realmente está dizendo é "estou tendo cuidado com as questões ambientais". Quando alguém de uma associação extrativista diz que uma exploração é sustentável, de modo geral o que ele realmente está dizendo é que "nossa atividade é menos destrutiva que outros usos da terra que poderiam ser feitos aqui". Tanto uma afirmação como a outra podem muito bem estar corretas - ou não, dependendo do caso. Mas nem uma coisa nem outra quer dizer, necessariamente, que as atividades em questão sejam sustentáveis. Isso vale para ambos os sentidos que mencionei aqui – tanto o sentido de fornecer recursos para as gerações futuras, como o sentido da demografia da própria espécie explorada.

Tomando por exemplo a própria castanha-do-Pará, pode ser verdade que explorar castanheiras tenha menos impacto que derrubar tudo e criar bois, mas nem por isso a exploração da castanha será sustentável. Caso não seja, isso trará a ruína não só da população biológica explorada, mas também das populações humanas estimuladas a depender de um recurso que não está conseguindo se renovar. Sustentabilidade ilusória não é bom para ninguém, muito menos para quem depende dela. Já ouvi o argumento "Ah, sim, mas até lá eles já vão estar usando outro recurso". Isso, claro, depois da população explorada originalmente ter sido dizimada. Ei, peraí, que diabo de sustentabilidade é essa?

A demografia, ou seja, o estudo das populações naturais, é um dos temas centrais da ciência fascinante, mas tão mal compreendida, que é a ecologia. A ecologia é a ciência que estuda as relações dos seres vivos entre si e com seu ambiente. Tem sido confundida com uma de suas aplicações, ou seja, os problemas ambientais. Mas há hoje uma forte ecologia acadêmica no Brasil, uma das melhores do Mundo, com muitos excelentes profissionais. Por que raramente se chama algum deles para avaliar a verdadeira sustentabilidade de alguma coisa, antes de se sair dizendo por aí que é sustentável? De um ponto de vista otimista, talvez seja por desconhecimento de que há por aí gente capacitada a avaliar essas coisas. De um ponto de vista mais pessimista, também pode ser porque quem diz, no fundo, muitas vezes não está interessado na resposta.

Isso pode parecer um detalhe de pouca importância para a conservação. Mas não é. Muito da popularidade da palavra sustentabilidade vem do fato de que ela soa tão bem. Antes de mais nada, claro, diz o que todos nós queremos ouvir. Depois, parece tão técnica que quem ouve geralmente supõe que para alguém estar dizendo isso, certamente deve haver profundo conhecimento técnico por trás para embasar. Por isso mesmo sustentabilidade, se mal usada, é uma palavra muito perigosa. É a chave mágica que abre todas as portas para exploração de populações biológicas em áreas que de outra forma seriam protegidas. É a base filosófica de todo um gigantesco paradigma no qual se assenta a atual política "ambiental" brasileira. Nunca antes na história desse país se demarcou tantas "reservas de desenvolvimento sustentável", em muitos casos sem se fazer a mínima idéia se a exploração estimulada com o nosso dinheiro é de fato sustentável. Se tudo isso for um gigante de pés de barro, estamos em maus lençóis.

Sustentabilidade, palavra perigosa: use com cuidado. Usar levianamente um conceito de tal importância é desastroso para as gerações futuras da própria definição, assim como para a conservação da biodiversidade. Como qualquer outra pessoa preocupada com o bem estar social da humanidade, adoraria ser convencido que qualquer utilização de recursos naturais seja de fato sustentável. Mas para isso é preciso ter argumentos convincentes que o demonstrem, não basta presumir que algo é sustentável só porque gostaríamos que assim fosse.

Biólogo, PhD em Ecologia pela Universidade de Durham (Inglaterra). Professor do Departamento de Ecologia da UFRJ, seu principal interesse em ensino e pesquisa é a Biologia da Conservação.


http://www.oeco.com.br/fernando-fernandez/45-fernando-fernandez/20233-a-tal-da-sustentabilidade

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

REFLEXÃO SOBRE A PERCEPÇÃO DE VALORES

Aquela poderia ser mais uma manhã como outra qualquer. Eis que o sujeito desce na estação do metrô: vestindo jeans, camiseta e boné, encosta-se próximo à entrada, tira o violino da caixa e começa a tocar com entusiasmo para a multidão que passa por ali, bem na hora do rush matinal. Mesmo assim, durante os 45 minutos que tocou, foi praticamente ignorado pelos passantes. Ninguém sabia, mas o músico era Joshua Bell, um dos maiores violinistas do mundo, executando peças musicais consagradas num instrumento raríssimo, um Stradivarius de 1713, estimado em mais de três milhões de dólares. Alguns dias antes Bell havia tocado no Symphony Hall de Boston, onde os melhores lugares custam a bagatela de 1000 dólares. A experiência, gravada em vídeo (http://br.youtube.com/watch?v=hnOPu0_YWhw), mostra homens e mulheres de andar ligeiro, copo de café na mão, celular no ouvido, crachá balançando no pescoço, indiferentes ao som do violino. A iniciativa realizada pelo jornal The Washington Post era a de lançar um debate sobre valor, contexto e arte. A conclusão: estamos acostumados a dar valor às coisas quando estão num contexto. Bell era uma obra de arte sem moldura. Um artefato de luxo sem etiqueta de grife. Esse é um exemplo daquelas tantas situações que acontecem em nossas vidas que são únicas, singulares, e a que não damos a menor bola porque não vêm com a etiqueta de seu preço. O que tem valor real para nós, independentemente de marcas, preços e grifes? É o que o mercado diz que você deve ter, sentir, vestir ou ser? Essa experiência mostra como na sociedade em que vivemos os nossos sentimentos e a nossa apreciação de beleza são manipulados pelo mercado, pela mídia, e pelas instituições que detém o poder financeiro. Mostra-nos como estamos condicionados a nos mover quando estamos no meio do rebanho.